Ainda que ocupando papéis
diferentes, eles incentivaram, cada um a seu modo, arte e tradições locais
RIO — Pernambuco perdeu, nos últimos
dias, Ariano Suassuna e Eduardo Campos, duas figuras que ocupavam papéis
diferentes, mas marcantes, no cenário cultural do estado. O primeiro, por sua
obra e por sua defesa da riqueza das tradições locais; o segundo, por seus
governos, que tiveram atuação ativa no incentivo à arte pernambucana. Suas
mortes, portanto, causam um impacto — sobretudo em termos simbólicos — que
artistas como o músico Antonio Nóbrega avaliam como decorrência natural de
“perdas muito fortes”:
— Ambos comungavam de uma visão de
Brasil e de um sonho em relação ao país, um Brasil mais consciente e pleno de
si. Espero que nós saibamos compreender o legado de ambos e possamos dar
continuidade.
Silvio Meira, cientista-chefe do Centro
de Estudos Avançados do Recife, afirma que o estado passa por um clima de
tristeza e desamparo que impacta todo o povo pernambucano.
— Pernambuco está em choque. É como se
tivessem tirado as fundações do estado. A liderança de Eduardo Campos era tão
expressiva no campo político, e a contribuição cultural de Suassuna era tão
intensa, que os vazios são imensos. Duvido que Pernambuco tenha estado tão
triste e indefeso como agora.
Meira, porém, acredita que, devido à
história e ao passado de contribuições de Pernambuco ao país, o estado irá se
recuperar. O escritor e dramaturgo Ronaldo Correia de Brito também defende que
Suassuna e Campos tiveram importância enorme para a cultura pernambucana, mas
que ela tem uma força autônoma e saberá superar suas mortes. Para ele, as
conquistas no campo da política cultural não estão sob ameaça, sobretudo porque
já se firmaram como um legado sólido.
— Durante os anos do governo Eduardo
Campos, cresceram os incentivos à produção artística, em todas as áreas, e o
Sistema de Incentivo à Cultura foi democratizado, permitindo o acesso de
pessoas e grupos que antes não chegavam a ele. Podemos dizer sem erro que o
governo Campos foi um grande mecenas das artes. Trata-se de uma semente bem
plantada, por lei, e por isso mesmo não creio que venha a sofrer retrocesso.
Diretor do premiado “O som ao redor”, o
cineasta Kleber Mendonça Filho reafirma as conquistas para a cultura com a
atuação de Eduardo Campos no governo, assim como a crença de que sua
consolidação fará com que elas sobrevivam à sua ausência:
— Quando Campos assumiu o governo, no
primeiro mês ele chamou cineastas e produtores para conversar. A partir daí,
ergueu um edital, teríamos um apoio firmado do estado à produção, algo que não
tínhamos. A partir de seu governo, esse apoio virou uma prioridade e foi
crescendo a cada ano, até estacionar há três anos em cerca de R$ 11 milhões —
lembra o diretor, que vê o futuro com otimismo. — Tanto Suassuna quanto Campos
tiveram participações específicas importantes, mas ambos são filhos de uma
região do Brasil que tem uma forma muito peculiar de olhar para a própria
cultura.